Em uma votação célere e estratégica, o Congresso Nacional aprovou, na noite da última quarta-feira (25), o projeto de lei complementar que aumenta o número de deputados federais dos atuais 513 para 531 a partir da próxima legislatura, que começa em 2027. A proposta agora aguarda sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A mudança é resultado direto de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou a necessidade de atualização da representação parlamentar dos estados de acordo com os dados do Censo Demográfico de 2022, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A última revisão do número de cadeiras na Câmara dos Deputados havia sido feita com base no Censo de 1986. Desde então, o número de vagas permanecia congelado, mesmo com profundas mudanças na distribuição populacional do país.
Votação rápida e articulação política
O projeto de lei complementar tramitou com velocidade incomum. Foi aprovado inicialmente no Senado, por 41 votos a 33, e poucas horas depois, na Câmara dos Deputados, com ampla maioria: 361 votos favoráveis e apenas 33 contrários. A aprovação rápida se deu em resposta ao prazo estabelecido pelo STF, que determinava que o Congresso aprovasse a nova divisão até 30 de junho. Caso isso não ocorresse, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) seria responsável por definir a redistribuição, o que esvaziaria a prerrogativa do Legislativo.
A articulação política foi liderada pelos presidentes das duas Casas: Hugo Motta (Republicanos-PB), da Câmara, e Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), do Senado. O relator da proposta no Senado, Marcelo Castro (MDB-PI), incluiu dispositivos que buscaram amenizar a resistência de parlamentares e da sociedade, preocupados com o aumento de despesas públicas em meio à discussão sobre responsabilidade fiscal.
Evitando perdas e ampliando a representação
Originalmente, a proposta previa apenas a redistribuição das 513 cadeiras existentes, o que implicaria na perda de representantes por alguns estados menos populosos. Para contornar esse desgaste político, o Congresso optou por criar 18 novas vagas, elevando o total para 531. Dessa forma, nenhum estado perderá representantes — uma solução negociada para viabilizar o avanço do projeto.
Segundo o texto aprovado, a nova distribuição das cadeiras passa a valer a partir da legislatura que se inicia em 2027. Os principais beneficiados são os estados que apresentaram crescimento populacional relevante nos últimos anos, de acordo com o IBGE:
Pará e Santa Catarina: +4 deputados cada
Amazonas, Mato Grosso e Rio Grande do Norte: +2 deputados cada
Goiás, Ceará, Paraná e Minas Gerais: +1 deputado cada
Estados com população menor, como Roraima, Acre, Amapá, Tocantins, Sergipe e outros, continuam com o mínimo constitucional de oito deputados. Já São Paulo, estado mais populoso do Brasil, mantém o teto máximo permitido, com 70 parlamentares.
Impacto financeiro e cláusulas de contenção
Apesar das preocupações com o impacto fiscal, o projeto tenta conter os custos com a inclusão de uma cláusula que proíbe qualquer aumento de despesas entre 2027 e 2030 motivado pela criação das novas vagas. Isso significa que os valores destinados a salários, cotas parlamentares, verbas de gabinete, auxílio-moradia e passagens devem permanecer congelados, com reajustes permitidos apenas para recomposição da inflação.
Ainda assim, a estimativa é que os custos diretos com os 18 novos parlamentares representem um acréscimo de cerca de R$ 64 milhões por ano ao orçamento da Câmara. Com o chamado “efeito cascata” — ou seja, o aumento proporcional em assembleias legislativas estaduais, que se baseiam na representação federal — o impacto pode chegar a R$ 95 milhões anuais.
Decisão judicial e futuro da representação
A decisão que levou à tramitação do projeto tem origem em uma ação movida pelo governo do Pará, que alegou omissão do Congresso ao não atualizar a representação estadual de acordo com o crescimento populacional. A ação foi acolhida pelo STF, que considerou que a atual composição da Câmara feria o princípio constitucional da proporcionalidade da representação popular.
A nova lei substitui a Lei Complementar nº 78, de 1993, e determina que as futuras atualizações no número de deputados federais sejam feitas obrigatoriamente com base nos dados oficiais do Censo, vedando o uso de estimativas populacionais intercensitárias. A próxima revisão deverá ocorrer com base no Censo de 2030.
Repercussão
Embora a proposta tenha sido aprovada com ampla maioria, ela enfrenta críticas de setores da sociedade civil, especialistas e parte da classe política, que veem a criação de novas cadeiras como um movimento dissonante com os esforços recentes de controle de gastos públicos. Além disso, questiona-se se a medida, ainda que atenda à proporcionalidade constitucional, trará ganhos reais de representatividade e eficiência legislativa.
Os defensores da proposta, por outro lado, argumentam que o país corrigirá uma distorção histórica e passará a contar com uma representação mais justa, proporcional ao número de habitantes de cada estado. “Não se trata de inflar a Câmara, mas de atender à realidade do Brasil de hoje. Durante quase 40 anos estivemos fora da legalidade”, afirmou o senador Marcelo Castro.
A sanção presidencial do projeto deve ocorrer nos próximos dias, respeitando o prazo fixado pelo STF. Caso seja sancionado sem vetos, o novo número de deputados valerá nas eleições de 2026 e será implementado na legislatura iniciada em 2027.