A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (Correios) enfrenta uma das piores crises financeiras de sua história recente. Para tentar manter a liquidez e reequilibrar o fluxo de caixa, a estatal formalizou o adiamento no pagamento de diversas obrigações que somam R$ 2,75 bilhões. A decisão é reflexo de 11 trimestres consecutivos de prejuízo e de um cenário cada vez mais desafiador para a empresa pública.
Segundo documento interno obtido pelo portal g1, a gestão financeira reconhece que o adiamento dos pagamentos foi necessário para garantir a continuidade das operações, diante do agravamento do déficit. “Essa iniciativa teve como objetivo central preservar a liquidez e reequilibrar, ainda que temporariamente, a estrutura do fluxo de caixa, mitigando os efeitos imediatos do desequilíbrio financeiro entre entradas e saídas”, afirma o texto.
Pagamentos suspensos
Entre os compromissos postergados estão repasses ao plano de saúde Postal Saúde, ao fundo de pensão Postalis, além de tributos e obrigações com fornecedores e funcionários. Confira a lista de valores adiados:
INSS Patronal – R$ 741 milhões
Fornecedores – R$ 652 milhões
Postal Saúde – R$ 363 milhões
Programa Remessa Conforme – R$ 271 milhões
Vale-alimentação/refeição – R$ 238 milhões
PIS/Cofins – R$ 208 milhões
Postalis – R$ 138 milhões
Franqueadas – R$ 135 milhões
Segundo a própria estatal, 53% da dívida se refere a valores cujo atraso acarreta multas e juros, mas não interrompe diretamente as operações da empresa.
Cobranças e ações judiciais
Além do comunicado interno, a crise financeira dos Correios também é evidenciada em documentos externos. A Receita Federal, por exemplo, aponta que a empresa acumula R$ 1,3 bilhão em tributos não pagos. Já transportadoras contratadas pelos Correios recorreram à Justiça Federal para cobrar R$ 104 milhões em dívidas atrasadas.
Tentativas de financiamento
Em busca de fôlego financeiro, os Correios anunciaram que esperam captar R$ 1,8 bilhão em novos recursos, mas não informaram se os valores viriam de empréstimos bancários ou de aportes do Tesouro Nacional.
Em dezembro de 2024, a empresa já havia contratado dois empréstimos, totalizando R$ 550 milhões, junto aos bancos Daycoval e ABC, com vencimento integral ainda em 2025. As parcelas começaram a vencer neste mês de julho.
Além disso, a estatal aguarda a liberação de um financiamento de R$ 4,3 bilhões junto ao Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), ligado ao BRICS. No entanto, esse recurso é vinculado exclusivamente a projetos de descarbonização e reestruturação logística, e não pode ser usado para cobrir rombos no caixa.
Causas da crise
A estatal atribui a deterioração financeira a diversos fatores, entre eles:
Mudanças regulatórias que afetaram o comércio internacional;
Queda no volume de postagens e na receita;
Crescimento da concorrência, especialmente após alterações nas regras de importação;
Histórico de subinvestimento em áreas estratégicas.
Os Correios também afirmam que 88% das despesas são fixas, envolvendo gastos com infraestrutura, frota, pessoal e manutenção — o que dificulta manobras para melhorar a eficiência orçamentária.
Prejuízo recorde
Em maio, os Correios divulgaram um prejuízo de R$ 1,7 bilhão apenas no 1º trimestre de 2025 — o pior início de ano desde 2017, quando a empresa passou a divulgar dados trimestrais. O resultado representa um aumento de 115% em relação ao mesmo período de 2024.
Dos 11 trimestres seguidos no vermelho, nove ocorreram sob a gestão de Fabiano Silva, atual presidente da estatal.
Apesar da gravidade do cenário, a empresa afirma em relatório que sua continuidade operacional está garantida por “fatores estratégicos e estruturais”, e que segue prestando serviços essenciais à sociedade.